‖ ‖ ‖ Lilian Figueiredo ‖ ‖ ‖
Nos últimos meses, os meios de comunicação voltaram à pauta da descriminalização da maconha, abordando a movimentação social e a reação do governo e da Justiça.
Os manifestantes da Marcha da Maconha ganharam espaço na revista Caros Amigos na internet: as matérias são extensas e acompanham a agenda do movimento. Os títulos das matérias sobre o assunto aparecem destacados na página principal do site com palavras que se posicionam ao lado dos manifestantes, em provocação ao governo.
No dia 3 de maio, a revista trouxe uma reportagem com o título “Manifestantes promovem ato pelo direito de realização da Marcha da Maconha”. Essa matéria traz a cobertura da panfletagem feita pelo grupo Marcha da Maconha de São Paulo no dia
29/04 para defender o direito de realização do evento no final do mês de maio.
A introdução da matéria retoma a repressão da edição do evento no Rio de Janeiro, ocorrida em 22 de abril. Há ali um panorama que situa o leitor entre dois manifestos, mas também escolhe determinados fatos para direcionar uma linha de raciocínio pretendida pela revista.
A voz dos organizadores da Marcha da Maconha é muito presente, rebatendo os argumentos dados pela Polícia Militar, que reprimiu o movimento no RJ. Em determinado momento, a escolha da revista fica ainda mais clara, quando opta por descrever a imagem dos manifestantes segurando uma faixa de protesto em frente ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Também é uma forma de conduzir o leitor à determinada informação. A descrição do repórter também expõe a reação das pessoas que passavam pelo ato e pelas faixas. A Caros Amigos noticia a panfletagem em São Paulo como resposta à repressão ocorrida no RJ dias antes e não procura fontes que se coloquem a favor da posição da Polícia para dar argumentos que expliquem o porquê da repressão.
Depois da cobertura da panfletagem, os manifestos do Grupo Marcha da Maconha continuaram e o site da Caros Amigos traz, no dia 24 de maio, o título: “Marcha da Maconha em SP é marcada por resistência à violência policial ”. A matéria mostra uma continuidade na abordagem do movimento, sempre buscando a visão de choque contra a Polícia. Dessa vez aparece como fonte o desembargador relator do processo de proibição da Marcha, Teodomiro Mendez. O foco da revista nas falas de Teodomiro é o preconceito contra a causa dos manifestantes: “não se trata de um debate de ideias, mas, apenas, de uma manifestação de uso público coletivo da maconha”. Além disso, o repórter ainda opta por buscar um fato anterior da vida do desembargador – em que foi condenado por agredir dois homens e não cumpriu pena – para explicitar um antecedente de repressão nas atitudes dele e os argumentos falhos como representante da Justiça.
Na sequência dos conflitos, a Marcha da Maconha passou a ser chamada de Macha da Liberdade (de expressão) e foi marcada para o dia 28 de maio em São Paulo. Com isso, podemos olhar para a cobertura feita por outro veículo e levar um susto: “Marcha na paulista tem clima Paz e Amor”, portal do Estado de SP, 29/05. É uma notícia curta e o título não aparece na página principal. A introdução cita cartazes bem humorados; passeata sem confusão; acordo com a PM; mas mesmo assim 2 prisões.
O Estadão opta pela fala do major Marcos Félix: “Não estamos descumprindo a decisão judicial. Estamos aqui para preservar a ordem pública”. O tom da reportagem com relação à repressão é ameno, e a reação da Polícia é tratada com tolerância, como se a instituição cumprisse “apenas sua obrigação”. Em síntese, o Estadão também cita a repressão ocorrida em manifestações anteriores, mas não em tom de agressividade com relação às atitudes das forças militares.
Quanto à pauta sobre a Marcha da Maconha, fica evidente o contraste entre a abordagem da Revista Caros Amigos e do jornal Estado de SP. Para a primeira, o motivo forte para acompanhar a Marcha é o tema “anti-governo” e o fato de ser pouco repercutido pela mídia. Para o segundo, a Marcha da Maconha – ou da Liberdade de Expressão – só será uma pauta mais atraente quando a questão chegar à política na proposta e votação de uma lei, por exemplo.
A relevância e o espaço a ser ocupado por cada pauta dependem de todo um contexto que envolve relações políticas, econômicas e morais. Para que as decisões aconteçam, o Governo e os movimentos se colocam em uma corrida na defesa dos próprios interesses. E nesse cenário, a mídia é capaz de provocar o eco entre os lados e fazer o alarde na sociedade. Sendo assim, a abordagem dos movimentos sociais, como é o caso da Marcha da Maconha, acaba por ser um fator que pode contribuir para se ganhar a corrida ou não.