‖ ‖ ‖ Luis Henrique Negrelli ‖ ‖ ‖
Há quem aposte que esteja ocorrendo, atualmente, uma sobreposição de recursos visuais em relação ao conteúdo textual. A onda das redes sociais, de aplicativos em dispositivos móveis, da popularização dos vídeos e fotos na internet são algumas das justificativas para afirmar que agora o usuário da internet não dá tanta atenção à leitura e busca de informação por meio de textos. Porém, o relatório The future of online news video, publicado pelo Reuters Institute for the Study of Journalism, da Universidade de Oxford, indica que essa visão não é totalmente verdadeira. De acordo com a pesquisa, alguns entrevistados disseram que não assistem a vídeos de notícias por acharem a leitura mais rápida e conveniente.
O relatório faz parte de uma série de publicações do Digital News Project 2016, que utilizou questionários online entre o final de janeiro e início de fevereiro de 2016. É baseado em uma pesquisa com mais de 50 mil pessoas em 26 países, entre eles, Estados Unidos, Canadá, Coreia do Sul, Japão, Austrália, Brasil, Reino Unido, Alemanha e outros 18 países europeus. A pesquisa também levantou dados de empresas como BBC, The Guardian, CNN e as digitais AJ+, Fanpage e Nowthis.
A conclusão principal do estudo revela que apenas cerca de 2,5% da média de tempo gasto com acesso a páginas de vídeo foi com vídeos de notícias, num intervalo de 30 sites de notícias online. O restante do tempo (97,5%) ainda é utilizado com texto.
Cerca de 75% dos entrevistados disseram que apenas ocasionalmente (ou nunca) consomem vídeos de notícias online.
Nos países analisados, aproximadamente um quarto (24%) dos entrevistados relataram que visualizam vídeos de notícias online em determinada semana. As porcentagens de visualizações variam de 33 % nos Estados Unidos, 32 % no Canadá e 30% no Brasil, até 16% no Japão e 15 % na Dinamarca.
Diferenças
Em relação à preferência por texto ou vídeo, a pesquisa evidenciou que nos países da amostra há uma maior inclinação ao consumo de texto ao invés de vídeo. Os dados variam de 68% dos entrevistados que preferem texto nos Estados Unidos e Alemanha, chegando a 80% na Itália. Nos Estados Unidos houve o maior percentual de preferência de vídeo sobre texto (11%), enquanto que nos outros três países do gráfico (Itália, Alemanha e Reino Unido) os números oscilaram entre 4% e 6%.
O relatório aponta os motivos da falta de interesse das pessoas em vídeo de notícias: 41% disseram que acham a leitura mais rápida e mais conveniente, 35% afirmaram que os anúncios antes dos vídeos os afastam e 20% declararam que os vídeos demoram mais para carregar. Outras justificativas: vídeos não adicionam valor ao texto (19%), existe uma preocupação com o custo dos dados móveis (9%) e em locais como ambientes de trabalho não é possível aumentar o áudio (7%).
O desafio para produtores de conteúdo online tornam-se maiores a partir das constatações do relatório. As opiniões de que os anúncios afastam os espectadores e que os vídeos não adicionam valor ao texto transformam-se em barreiras a serem enfrentadas. Com a mudança no padrão de visualização, as empresas de transmissão estão buscando se adaptar as novas realidades de comportamento do consumidor. A maior utilização de mídias móveis e redes sociais como fonte de informações tem dificultado o trabalho de captura da atenção dos espectadores por mais tempo.
A pesquisa comprovou que há um crescimento no consumo de notícias fora dos sites originais. Em países como Espanha, Itália e Grécia, a porcentagem de pessoas que assistem a vídeos de notícias via redes sociais é maior que os índices de consumo nos próprios sites de notícias. O Brasil apresenta uma alta diferença entre os dois fatores: 33% dos entrevistados afirmaram que na maioria das vezes assistem a vídeos de notícias nos próprios sites e mais da metade (52%) alegou que os visualizam por meio das redes sociais.
Para incrementar o estudo, foram levantados dados da BBC, que disponibiliza uma quantidade considerável de vídeos em seu site. Entre setembro e outubro de 2015, 11% dos visitantes do site da BBC News e do aplicativo utilizaram vídeos. The Guardian, em abril de 2016, informou que cerca de 7% dos usuários na internet e no aplicativo acessaram os vídeos mensalmente e que, mesmo com a pequena proporção, o número de vídeos cresceu 45% entre maio de 2015 e maio de 2016. As visualizações no Facebook do The Guardian aumentaram 138% entre setembro de 2015 e maio de 2016.
Hard news vs. soft news
O relatório aponta que quase 40% dos vídeos de maior sucesso são relacionados a conteúdos de entretenimento e estilo de vida, ao invés de notícias factuais. Mesmo para marcas do hard news como The Guardian ou The Independent, os vídeos mais vistos no Facebook acabaram por ser de soft news.
Uma das atitudes que podem levar à queda de interesse pelos vídeos de notícias online é a falta de adaptação desse conteúdo para o ambiente virtual. Alguns vídeos são retirados da televisão e postados nos sites e redes sociais como resumos ou na íntegra, sem conter a chamada ‘versão para web’. A pesquisa aborda uma ação que tem sido tomada para aumentar as visualizações: a maioria dos vídeos (71%) teve uma sobreposição de texto para que pudessem ser facilmente compreendidos sem som.
O caso dos ataques em Paris em 2015 serve como exemplo de caso para o relatório. Após o atentado, muitas pessoas passaram a se informar via redes sociais, com vídeos de outras pessoas sobre o ocorrido. A grande mídia ainda não havia chegado ao local, porém através de smartphones a notícia começou a circular pela internet. Posteriormente, todos esses vídeos serviram para o noticiário internacional retratar o acontecimento. Em relação à audiência, o dia dos ataques foi o de maior tráfego online para BBC. No dia seguinte ao ocorrido, o índice de usuários assistindo vídeos quase duplicou, chegando a 19% no site e 22% no aplicativo BBC News. O estudo concluiu que os vídeos são parte importante nas primeiras 24 horas de uma notícia de grande proporção. O destaque, porém, é notado analisando-se as redes sociais, em que a maior parte do consumo veio via Facebook, com 15 milhões de visualizações no site da BBC e quase 2 milhões no Youtube.
A questão chave para a produção de vídeos está centrada nas variadas plataformas, nos múltiplos gêneros e nas estratégias de atração do espectador. As conclusões do relatório servem de base para que produtores de conteúdo, sobretudo, da grande mídia, aprimorem sua técnicas de divulgação e produção. Já não é mais suficiente apenas publicar um vídeo se a intenção for realmente alcançar mais público.
Empresas como Fox News, CNN, BBC e as mais novas AJ+, Fanpage e Nowthis têm buscado investir mais na produção de vídeo, mas também tentado reconhecer o público consumidor que tem se dirigido, cada vez mais, para as redes sociais e dispositivos móveis. Essas atitudes aos poucos estão modificando o modo de produção de vídeos e, principalmente, de divulgação de notícias.