Unesco propõe referências para alfabetização midiática


‖ ‖ ‖ Carolina Ito ‖ ‖ ‖

 

Dizer que nos deparamos com uma grande quantidade de informação todos os dias, sobretudo pela utilização dos meios digitais, já é comum entre pesquisadores de comunicação e entre os próprios usuários dos meios. Nesse contexto, surgem questionamentos, como o que fazer diante da velocidade no fluxo de informações? Como selecionar e filtrar o vasto conteúdo acessível na internet? E, a questão mais complexa, como avaliar esse conteúdo de maneira crítica e responsável?

A Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) vem elaborando propostas para preencher essas lacunas por meio de eventos internacionais e documentos sobre o uso das novas tecnologias de informação e comunicação. Em abril, a organização lançou a versão em português do “Currículo de Alfabetização Midiática e Informacional Para Formação de Professores”, em parceria com a Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Esse documento, elaborado por especialistas da área de comunicação e educação, traz diretrizes para que o conceito de Alfabetização Midiática e Informacional (AMI) seja incorporado nas disciplinas de escolas e universidades em vários países.

A criação do currículo para professores segue as orientações contidas na Declaração de Grünwald, (1982) e na Declaração de Alexandria (2005), que reforçam os direitos do cidadão à liberdade de expressão e de transmitir e receber informações em qualquer meio. Também reconhecem que, para fruição plena desses direitos, são necessários mecanismos que promovam a reflexão crítica acerca dos processos e produtos midiáticos, bem como a inclusão social por meio da tecnologia.

Benefícios e objetivos do currículo

A AMI tem como objetivo empoderar os alunos para que tenham uma aprendizagem mais autônoma e para que possam “utilizar as mídias e as comunicações tanto como ferramentas, quanto como uma maneira de articular processos de desenvolvimento e mudança social”, de acordo com o documento da Unesco. Para cumprir esse objetivo, a proposta de currículo orienta os professores no uso eficaz dos provedores de informação como a mídia, ferramentas de busca na internet, bibliotecas e arquivos.

Outro aspecto considerado pelas diretrizes da AMI é que o governo também deve atuar como provedor de informação e plataformas de debate democrático. Exemplo de plataforma são os portais eletrônicos de governo, através dos quais são divulgadas informações sobre políticas e serviços públicos, prestação de contas e canais de interação com a sociedade, como fóruns, debates e enquetes.  O cidadão precisa estar preparado para receber esse tipo de informação e compreendê-lo de maneira crítica, o que traz, como consequência, maior engajamento nos processos políticos. Dessa forma, a alfabetização não inclui apenas competências e habilidades nas áreas informacional e midiática, mas também a educação para cidadania.

O público-alvo da proposta de currículo são professores de ensino médio e superior em atuação ou em formação. As estratégias oferecidas na AMI servirão para complementar e aprimorar o ensino tradicional a partir de três áreas temáticas: “1) o conhecimento e a compreensão das mídias e da informação para os discursos democráticos e para a participação social; 2) a avaliação dos textos de mídia e das fontes de informação; 3) a produção e o uso das mídias e da informação”.

A proposta oferece estratégias para que professores e alunos tenham maior domínio no uso das tecnologias que, na definição da Unesco, são aparatos que permitem a comunicação de duas vias, ao contrário dos meios de comunicação de massa (como rádio e televisão) que permitem a comunicação de uma via. Entender o uso dessas ferramentas é fundamental para a AMI, pois os meios digitais, que estão evoluindo em termos de recursos multimídia, transformam não só a maneira pela qual as pessoas recebem e emitem informações, mas também as formas de trabalho que o jovem irá encontrar em seu futuro profissional.

AMI: como fazer?

No aprofundamento do conceito de AMI, o documento esclarece as diferenças entre a alfabetização voltada para o campo informacional e a que compreende o campo midiático. A primeira está relacionada a uma análise ética da informação e de suas formas de acesso. A segunda está preocupada com os processos de produção jornalísticos e da mídia em geral, avaliando suas funções sociais. Dessa forma, estudantes e professores estarão aptos não apenas a interpretar e refletir sobre os produtos midiáticos, mas também analisar o processo produtivo da informação.

Nesse sentido, a parte prática é fundamental para que os estudantes possam compreender os critérios de seleção e difusão de conteúdo informativo, além de desenvolverem habilidades no uso das tecnologias. O resultado esperado das atividades práticas é que os alunos valorizem a diversidade, a pluralidade de vozes e a comunicação nos princípios éticos e democráticos.

Para orientar os professores na alfabetização midiática e informacional, são propostos nove módulos de ensino e uma série de módulos complementares. Cada um deles traz contexto e justificativa, tópicos principais, objetivos, propostas de atividades pedagógicas e orientações para avaliação do aprendizado. Além dessa ferramenta, alunos e professores terão acesso à Plataforma de Recursos Educacionais Abertos da Unesco, que permite copiar e compartilhar livremente publicações e materiais de aprendizagem, com licenças de propriedade intelectual alternativas (a exemplo do Creative Commons).

O “Currículo de Alfabetização Midiática e Informacional Para Formação de Professores” foi bem recepcionado pelos representantes da UNESCO no Brasil, que resultou na tradução do documento para o português. E para que o projeto seja implementado no sistema de ensino, serão necessárias políticas nacionais que reforcem os direitos fundamentais de liberdade de expressão e direito à informação.

 

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