‖ ‖ ‖ Heloisa dos Santos ‖ ‖ ‖
A liberdade de imprensa está sob ataque. Essa afirmação, que vem sido repetida com mais intensidade devido à ascensão de lideranças conservadoras que tentam censurar veículos e jornalistas, tem o reforço do Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa, da organização Repórteres Sem Fronteiras.
Mesmo países com forte tradição de imprensa livre, como os Estados Unidos (48º posição no ranking), apresentaram queda nos seus índices. O setor está em alerta desde que o atual presidente, Donald Trump, assumiu o poder e passou a tachar qualquer notícia de que não gostasse ou fosse conveniente como “fake news” e a tentar, entre outras investidas, revogar credenciais de um jornalista, utilizando vídeos manipulados para se justificar.
Reflexo da situação política do país, os níveis de liberdade de imprensa diminuíram principalmente em países nos quais setores considerados de extrema-direita têm avançado, como Filipinas (134º) e Hungria (87º). O cenário geral é preocupante: 40% dos países do ranking estão em situação “difícil” ou “muito séria”. Esse número supera a porcentagem dos que estão em situação “boa” ou “satisfatória”, que somam 24%, que, aliás, é menor em 2% do que no ano anterior. Essa tendência é confirmada por outros relatórios de liberdade de imprensa, como o da Freedom House e o 2018 Killed Journalists Report, da Federação Internacional de Jornalistas, que mostra o aumento de mortes e prisões pelo mundo.
No caso do Brasil, que está em 105º lugar, a liberdade de imprensa tem sido atacada agressivamente, com ataques do presidente a jornalistas, tentativas de censura e intimidação. O Repórteres Sem Fronteiras classifica o país em situação “problemática”, tendo uma queda de três posições em comparação a 2018. Embora essa consideração também se aplique a outros países da América do Sul, como Argentina (57º), Chile (46º), estamos mais próximos da Colômbia (129º) e Venezuela (148º), que estão em situação “difícil”.
Ameaças e perseguições no Brasil
Ataques à imprensa independente, sanções econômicas às mídias hegemônicas que criticam o governo de turno e um favorecimento claro para meios que defendem suas pautas são alguns dos fatores que compõem o contexto do jornalismo brasileiro atual.
O primeiro caso tem ganho cada vez mais visibilidade e vem se desenrolando desde maio de 2019, que é o do Intercept, após a publicação de chats e áudios que indicam conluio entre procuradores e Sérgio Moro. Seus jornalistas vêm sofrendo ataques e ameaças, e precisaram tomar medidas de segurança.
O segundo caso é o da Revista AzMina, que, após publicar informações sobre o procedimento de aborto legal e instruções da Organização Mundial da Saúde, passou receber ataques online e foi ameaçada de ser denunciada por apologia ao crime pela ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves.
Não é a primeira vez que esses dois veículos recebem repercussão negativa, porém, dessa vez há a presença ostensiva de figuras de autoridade política tentando reprimir e impedir suas atividades.
Mesmo para a parte da imprensa que não sofre esse tipo de perseguição clara, a situação segue sem muita esperança de melhorar. Após a enxurrada de notícias falsas durante as eleições de 2018 e as atitudes do presidente Jair Bolsonaro com repórteres, não respondendo perguntas ou conversando de forma hostil, as dificuldades da cobertura política se intensificaram.
Há preocupação, também, com a credibilidade da mídia entre o público e as ações de uma milícia virtual, que buscam distorcer e atacar massivamente conteúdo crítico ao governo federal. A Repórteres Sem Fronteiras define a situação brasileira em uma frase: “uma escuridão que se anuncia”.