‖ ‖ ‖ Clara Tadayozzi ‖ ‖ ‖
Presente na XIX Jornada Multidisciplinar, Rousiley Celi Moreira Maia é doutora em ciência política pela University of Nottingham (Inglaterra) e pesquisadora das relações entre comunicação e política, com ênfase em democracia deliberativa, esfera pública e teoria do reconhecimento.
Nesta entrevista ao Plural, ela discute seus temas de pesquisa e traça ligações entre eles e acontecimentos da atualidade.
Uma de suas pesquisas atuais analisa os hábitos de conversação dos cidadãos frente a situações divulgadas em ambientes online. Em sua opinião, os espaços digitais disponíveis na atualidade favorecem a ocorrência de conflitos sociais e de manifestações de ódio?
Em certa medida, certos espaços online, principalmente aqueles ligados a anonimato, em que as pessoas não têm que responder por suas expressões, podem levar a esse tipo de atitude. Mas é sempre importante olhar para o tipo de ambiente. As pesquisas mostram que os ambientes das redes sociais são extremamente diversos. As normas e expectativas com que as pessoas interagem dizem muito sobre como elas se comportam.
Estudos mostram que nos blogs, ainda que as pessoas pensem de maneira divergente, elas se respeitam e dialogam, enquanto que em ambientes como o YouTube as pessoas falam com uma massa desconhecida e, nesse caso, tendem a favorecer manifestações desrespeitosas, de ódio e intolerância.
Em um de seus artigos, você discute as formas de representação política em busca da legitimidade de demandas. Você aponta que é usual o surgimento de grupos, coletivos e organizações em defesa de interesses comuns de determinados sujeitos que sofrem injustiças, mas afirma que essa é uma solução insatisfatória, que suscita diversos problemas. Do seu ponto de vista, qual seria o caminho adequado para se construir formas de representação legítima em relação às pessoas afetadas por injustiças?
A representação é sempre importante. Principalmente para aqueles grupos que sofrem de injustiça extrema, quando não têm oportunidades de expressar suas vozes. A representação não é o ideal, mas ter pessoas que defendam interesses e tentem sensibilizar contra injustiças é fundamental.
Para fazer com que as representações sejam mais legítimas, é importante criar práticas de interação e de escuta recíproca, atenta e respeitosa, para que essas pessoas sejam entendidas não como objeto de justiça, mas como sujeitos de justiça, portanto, capazes para expressar suas experiências, seus danos, definir práticas de injustiças, remédios e soluções. Para aperfeiçoar a legitimidade da representação, criar oportunidades para interação e empoderar essas pessoas para que elas tenham voz e falem das suas experiências é fundamental.
Um de seus temas de pesquisa envolve a atuação da sociedade civil na manutenção da democracia. Você acredita que as manifestações sociais que se sucederam a favor do atual processo de impeachment contra a presidente Dilma contribuíram para esse propósito, ou foram protestos que reivindicaram práticas antidemocráticas?
Nós temos que ver as mobilizações como processos de politização e despolitização. Embora tenhamos uma tendência a estudar a boa sociedade civil, há a má sociedade civil.
Existem movimentos pró e contra nesses momentos de conflito que suscitam o dissenso na sociedade, e se aliam a grupos e a elites que estão ligadas às instâncias políticas. Temos que ver tanto o lado da politização e despolitização, quanto dos conflitos que estão ligados a segmentações e grupos ideológicos mais amplos na sociedade.
Em um artigo, você aborda a análise de enquadramentos de mídia para a identificação de frames culturais. A maneira como a mídia seleciona e enquadra certos assuntos pode favorecer o desenvolvimento e perpetuação de ideologias nem sempre benéficas, como machismo, preconceito e violência?
Temos que olhar primeiro para assuntos distintos; não é possível fazer um diagnóstico homogêneo. Diferentes temas, assuntos e pautas têm coberturas e desenvolvimentos distintos. Muito frequentemente, quando não há grupos mais fortes e a questão ainda não é suficientemente politizada, a televisão tende a ter um comportamento mais conservador e a violar valores e práticas.
Mas há muitos anos, há vários grupos que demandam responsabilidade dos agentes dos media, tanto do telejornalismo, quanto da teledramaturgia e dos programas de um modo geral. Se há uma violação clara, e se há movimentos organizados da sociedade, os media ou esses programas são chamados a responder por essas violações. Eu vejo como um espaço conflituoso e de luta. Existem vários estudos mostrando, por exemplo, como a atuação de diretores negros, ou de mulheres, transformaram os padrões de interpretação, de reportagem ou de entretenimento dentro dos próprios media.
É possível ver a relação dos media e a sociedade. Grupos organizados, como os movimentos sociais e os observatórios dos media promovem certos valores e aprendizagem. Assim como existem certos agentes internos profissionais que também militam por certos temas e causas. É um terreno complexo e diversificado.