Reino Unido promove consulta pública sobre autorregulação


‖ ‖ ‖ Bibiana Alcântara Garrido ‖ ‖ ‖ 

 

De 16 de fevereiro a 11 de abril de 2016, o Press Recognition Panel (PRP), órgão independente estabelecido por determinação governamental para supervisionar a regulação de mídia impressa no Reino Unido, manteve aberta uma consulta pública para receber propostas sobre como avaliar os sistemas de autorregulação instituídos pelos meios. Ao invés de regular diretamente os veículos de comunicação, o órgão fornece um reconhecimento de autorregulação por meio da revisão e da emissão de relatórios sobre a atividade de uma empresa de mídia. Para David Wolfe, coordenador do PRP que apresentou um webinar sobre o assunto, as funções legais incluem “se o veículo cumpre com sua proposta de autorregulação” (Wolfe, 2016). Os membros do PRP não recebem remuneração, devem ser independentes da indústria e incluem acadêmicos, jornalistas e editores aposentados.

Instrumentos de responsabilização da mídia

Os instrumentos de responsabilização da mídia, ou media accountability instruments na sigla em inglês (MAIs), são definidos como meios independentes do governo utilizados para induzir a mídia a prestar serviços públicos de qualidade, e são classificados em: a) internos: carta do editor, código de ética, espaço de correção, pesquisa sobre os leitores, comitê da redação, entre outros; b) externos: grupos de consumidores da mídia, incentivos à criação de ONGs, projetos de mídia alternativa, pesquisas sem fins lucrativos; e c) cooperativos: carta ao editor, ombudsman, encontro com o público, conferências, prêmios e recompensas, etc (Bertrand, 2002). Os MAIs são, de maneira geral, uma forma de atestar a qualidade jornalística de determinado veículo ao seu receptor ou receptora sem ferir a independência ou liberdade de imprensa.

No Reino Unido, a qualidade no jornalismo remonta à discussão sobre a regulação da mídia impressa, pauta que é constante na agenda política do país desde a segunda metade do século XX. Com a constatação de “um declínio progressivo no caráter pessoal dos editores e na qualidade do jornalismo britânico” (Tomlinson, 2014, p. 7, tradução nossa), diversas foram as iniciativas da primeira, segunda e terceira Royal Commission on the Press, a Comissão Real para a Imprensa, para o aprofundamento da liberdade de expressão e de opinião da mídia impressa, bem como da qualidade e precisão nas notícias (Jewell, 2013, p.39, tradução nossa). Sem um resultado efetivo de avanço e melhoramento do jornalismo, e com a revelação de escândalos envolvendo o grampeamento de telefones por parte dos próprios jornalistas britânicos, um Royal Charter de 1° de março de 2014 estabeleceu um órgão independente para a regulação dos meios impressos no Reino Unido.

Funcionamento do PRP

O PRP adotou sua proposta de reconhecimento autorregulatório com base nos critérios definidos pelo juiz britânico Sir Brian Henry Leveson, então chefe do inquérito público que buscou novas definições para a autorregulação e publicou, no ano de 2012, um extenso relatório sobre o contexto histórico da mídia britânica com recomendações para o aprimoramento da autorregulação da imprensa. Em meio à explanação dos critérios para o recebimento do certificado do PRP, destacam-se os itens da efetividade, compromisso com o leitor, justiça e objetividade nos códigos de ética, independência e transparência (United Kingdom, 2012), itens que se classificam também como instrumentos de responsabilização midiática, ou quaisquer instrumentos “utilizados pelos profissionais e usuários da mídia para monitorar, comentar e criticar o jornalismo”, além de buscar “promover e expor o debate dos problemas” da profissão (Eberwein; Fengler; Lauk; Leppik-Bork, 2011, p. 20).

Caberá ao órgão regulador observar, na forma do mecanismo aprovado efetivamente pela consulta popular, o cumprimento dos requisitos éticos, profissionais e de media accountability na imprensa do Reino Unido. Primeiramente, as avaliações e relatórios poderão ser requisitados ao PRP sem custos adicionais, o que muda a partir de novembro de 2017, quando será feita nova consulta ao público sobre a possibilidade de cobrança pelo serviço de certificado autorregulatório, e qual deveria ser o valor nesse caso (Wolfe, 2016). De fato, a autenticação vinda do PRP interessará aos variados veículos da imprensa britânica por se tratar de algo como um “certificado de qualidade”, o que traria sem dúvidas benefícios na relação de confiança com os leitores.

 

Referências

BERTRAND, Claude-Jean. O arsenal da democracia: sistemas de responsabilização da mídia. Bauru, SP: Edusc, 2002.

WOLFE, David. Consultation on reviewing approved regulators. Press Recognition Panel. Webinar online video. Disponível em: https://event.webcasts.com/viewer/event.jsp?ei=1096962. Acesso em: 28 mar. 2016.

EBERWEIN, Tobias; FENGLER, Suzane; LAUK, Epp; LEPPIK-BORK, Tanja (eds.). Mapping Media Accountability – in Europe and Beyond. Köln: Halem, 2011.

JEWELL, John. ‘How Many Drinks in that ‘Last Chance Saloon’? The History of Official Inquiries Into the British Press’. In: MAIR, J. (ed.) After Leveson, The future for British Journalism. London: Abramis, 2013. 

UNITED KIGDOM. The Leveson Inquiry: an Inquiry into the culture, practices and ethics of the press. London: House of Commons, 2012.

TOMLINSON, Hugh. The New UK Model of Press Regulation. LSE Media Policy Brief 12, March, 2014.