‖ ‖ ‖ Bruna Giorgi ‖ ‖ ‖
A representação da mulher na mídia é um tema delicado e que precisa ser cuidadosamente discutido, principalmente porque, em geral, a coisificação é uma das formas mais comuns de associar a mulher a um produto ou tema, seja na publicidade ou no jornalismo. Quando se aborda a representativa da mulher brasileira na televisão, o tema se torna ainda mais complexo, por conta da diversidade cultural e pelo fato de a tevê ser um veículo de alta penetração e informação. “Se somos capazes de observar essa diversidade na cultura, por que os grandes meios de comunicação mostram apenas um tipo de mulher brasileira?”. Essa é uma indagação feita logo no início do documentário de 2014 “Mulheres brasileiras: do ícone midiático à realidade”, que reflete sobre como a imagem da mulher brasileira é veiculada na mídia televisiva, jornalística e publicitária.
A peça audiovisual, produzida e divulgada pela Revista Pueblos, editada pela organização Paz com Dignidades, expõe a temática em 14 minutos, oferecendo um panorama crítico através da explanação de ativistas e estudiosas na área e da exemplificação de conteúdo comum transmitido na televisão brasileira.
A partir da premissa de que o problema orbita em torno da concentração dos meios de comunicação por seis famílias — Abravanel (SBT), Chivita (Grupo Abril), Saad (Rede Bandeirantes), Frias (Folhas de SP), Marinho (Rede Globo) e Sirotsky (Rede Brasil Sul) —, o documentário “conversa” com mulheres ativistas ou vinculadas ao Instituto Patrícia Galvão, com a intenção de provar que a brasileira é coisificada na mídia. A causa disso é a briga pela fatia da publicidade da concentração da imprensa, proporcionando a estandardização da mulher branca, magra, jovem e heterossexual.
Terezinha Vicente, da Rede Mulher e Mídia, observa que o problema da representação é mais difícil de ser solucionado do que se pode pensar, já que mais de 90% da população brasileira assiste aos programas televisivos todos os dias e grande parcela se informa apenas por esse veículo. Além da mulher não observar uma representação que se pareça com ela, a tevê pode desencadear a erotização precoce das meninas, violência e sexualidade banalizada e o corpo da mulher mercantilizado. Terezinha provoca algumas indagações comuns ao campo da identidade e que, neste caso, são respondidos pelo conteúdo televisivo: Que mulher eu quero ser? Que imagem de mulher de sucesso que eu tenho que buscar?
Jacira Melo, diretora do Instituto Patrícia Galvão, acredita ser necessária a criação de uma regulação que limite a concentração de meios e promova a discussão da produção de conteúdos. Segundo ela, a publicidade está ultrapassada no país, principalmente quando se refere à mulher. Para perceber isso, é só pensar em quem produz publicidade: uma elite masculina, branca, machista e com visão europeizada do mundo.
Rita Freire, também da Rede Mulher e Mídia, é outra entrevistada. Ela aponta a linguagem de rápida absorção das mídias como ferramenta para gerar números e retornos financeiros, proporcionando uma linguagem chula para representar a mulher. A exemplificação é feita pelas propagandas de cerveja que hipererotizam o corpo feminino e associam o consumo de uma bebida à conquista de uma mulher. Além disso, Rita enfatiza a importância dos movimentos para mudar as regras da comunicação, já que existem leis que completam 50 anos sem renovações significativas. Outra solução citada por ela é a criação de um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para democracia da comunicação que preveja um terço do conteúdo possível para a mídia privada, um terço para a pública e um terço para a estatal.
As irmãs e ativistas Melissa e Iris Miranda citam exemplos comuns e pouco refletidos que legitimam uma falsidade de a mulher ser aquilo que ela não é, como nos cados da propaganda de depilação e absorventes. A preocupação desse tema, conforme elas, é pensar na comparação da imagem veiculada pela tevê do homem e da mulher, realçando ainda mais a coisificação da mulher e a superioridade masculina. As ativistas também citam a internet como um veículo poderoso para o engajamento das pessoas e, principalmente, das mulheres, como foi o caso da Marcha das Vadias — ocorrida no Brasil em 2011 pela primeira vez —, que teve a mobilização nas redes sociais e cada cidade criou uma página própria no Facebook, como São Paulo e Brasília.
Apesar de esclarecedor, o documentário não dialoga de fato com a diversidade brasileira. O aspecto relevante de crítica, indicado por comentários do vídeo no YouTube, é a presença somente de mulheres brancas nas entrevistas. Tal crítica foi respondida pelo perfil Pueblos-Revista de Información y Debate. Os produtores alegaram não ter recursos para fazer diferente.