Desafios para a nova gestão do MinC


‖ ‖ ‖ Carolina Ito ‖ ‖ ‖ 

 

Após vinte meses de gestão de Ana de Hollanda no Ministério da Cultura, Marta Suplicy assumiu a pasta a pedido da presidente Dilma Rousseff.  A cerimônia de posse ocorreu no dia 13 de setembro, e a expectativa é a de que ocorram avanços em relação à gestão anterior, fortemente criticada por diversos segmentos de cultura. O alegado despreparo de Ana de Hollanda para liderar o MinC foi baseado na comparação com a administração do governo Lula, na qual Gilberto Gil e Juca Ferreira assumiram o cargo no primeiro e segundo mandatos do presidente, respectivamente.

Na gestão de Hollanda, foi retirado o selo do Creative Commons do portal do MinC, que permite flexibilizar os direitos sobre a propriedade intelectual. Essa atitude desagradou parte da comunidade artística, sobretudo aqueles que acompanhavam a intensa discussão sobre direitos autorais nas gestões anteriores do Ministério. A retirada do selo poderia sinalizar a interrupção do debate e apoio à cobrança de direitos autorais que, no Brasil, é feita pelo Escritório Central de Arrecadação (Ecad).

O Ecad é uma entidade privada e sem fins lucrativos, responsável por arrecadar e distribuir impostos sobre a execução pública de músicas, shows, entre outras produções artísticas. O órgão é investigado em uma CPI por conta de denúncias sobre irregularidades no repasse de verba aos artistas, atividade lucrativa e formação de cartel. Nesse processo, o MinC advogou em favor do Ecad, embora isso tenha sido pouco comentado pela grande mídia.

Interrupções no Programa Cultura Viva (implementado durante a gestão de Gilberto Gil), corte de verbas aos Pontos de Cultura e abandono de políticas relacionadas à cultura digital são outras alegações feitas contra a administração de Ana de Hollanda. Em março deste ano, intelectuais e artistas decidiram formalizar essas críticas em um documento entregue à Casa Civil, pedindo pela saída da ministra.

A falta de diálogo com a sociedade também é apontada entre as principais falhas da administração de Hollanda, e é possível imaginar que uma das missões mais importantes da gestão de Marta Suplicy será restabelecer esse contato de forma mais democrática. Esse objetivo também está de acordo com os princípios da PEC nº34, que permite a criação do Sistema Nacional de Cultura, aprovada um dia antes da nomeação de Marta.

Uma política de longo prazo

O Sistema Nacional de Cultura começou a ser idealizado em 2003, com o intuito de estabelecer uma política de Estado que não sofra influência da troca de governos. Outro objetivo é integrar instâncias federais, estaduais e municipais no desenvolvimento de políticas públicas, juntamente com fóruns e conselhos que envolvam a participação da sociedade civil.

Para viabilizar a ação do SNC, foi criado o Plano Nacional de Cultura, previsto pela Constituição pela aprovação da PEC nº 48, em 2005. Em dezembro de 2010, após tramitar como Projeto de Lei (nº 6835), o PNC foi sancionado pelo presidente Lula e terá o prazo de oito anos para que sua implementação seja concretizada.

No período da gestão de Juca Ferreira, o MinC lançou um documento com as diretrizes gerais do Plano Nacional de Cultura, feito a partir de consultas públicas, audiências e debates, incluindo a 1ª Conferência Nacional de Cultura, realizada em 2005.

Um dos primeiros direcionamentos do PNC é compreender a cultura de forma abrangente, envolvendo as diversas expressões simbólicas e o direito à cidadania. A partir dessa concepção, valorizar a diversidade artística brasileira e promover a universalização do acesso à produção cultural tornam-se objetivos centrais das políticas do plano.

A manutenção de políticas de longo prazo e o fortalecimento institucional também são diretrizes expressas no documento, que serão realizadas no sentido de coibir o monopólio comercial e atividades econômicas que prejudiquem a manifestação da pluralidade cultural. Nesse ponto, é preciso questionar os efeitos das leis de incentivo (como a Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual), que podem ser aprofundadas com base nas diretrizes gerais.

Apesar de rejeitar a exploração comercial irrestrita da produção de cultura, o PNC incorpora a noção de “economia da cultura”, que permite o desenvolvimento econômico sustentável. Durante a cerimônia de posse à frente do MinC, Marta Suplicy declarou que o ministério “não faz cultura, ele proporciona espaços, oportunidades e autonomia para que a cultura se produza” e que não pode aceitar “a lógica devastadora do mercado”, mas deve permitir que os artistas tenham condições de viver de sua arte.

Outra característica importante do PNC é a ênfase no acompanhamento e avaliação das ações junto à sociedade civil que visam “consolidar os sistemas de participação social na gestão das políticas públicas”. Nesse processo, o portal do Ministério da Cultura será utilizado para divulgar informações sobre as decisões do órgão e receber colaborações dos usuários, o que já é feito, em certa medida, desde o governo Lula. Além disso, o Ministério deve se comprometer a realizar conselhos em âmbito federal, estadual e municipal e debates públicos sobre as políticas da área.

O Plano Nacional de Cultura agrega segmentos que vão, desde as manifestações da cultura popular, até a moda e a culinária como formas de expressão do patrimônio cultural e artístico brasileiro. O projeto apresenta missões específicas para cada um desses setores e, nesse momento, cabe à Marta Suplicy e às próximas gestões do MinC darem continuidade a essa política que deve permanecer insolúvel diante de mudanças no governo. 

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