Jornal desconfia de produção colaborativa de cultura na internet


‖ ‖ ‖ Mariane Bovoloni ‖ ‖ ‖

 

A febre começou em maio deste ano. Após postar na internet o vídeo da música “Oração”, a Banda Mais Bonita da Cidade, de Curitiba, saiu do anonimato para o sucesso em apenas uma semana. Com mais de um milhão de visualizações em sete dias, o quinteto se viu em meio a elogios, críticas e entrevistas.

Em meio a esse turbilhão de acontecimentos, outra novidade: o financiamento da gravação do primeiro CD da Banda através da internet. Sem dúvida, uma alternativa promissora perante a crise da indústria fonográfica.

Na mídia, em especial o jornal Folha de S. Paulo, cujas matérias são objetos deste artigo, a banda não recebeu muito crédito. Pelo contrário, os elogios foram poucos e o sucesso, encarado como passageiro.

A primeira matéria analisada é de 25 de maio, uma semana após a postagem do vídeo “Oração” no Youtube.com. O destaque, no entanto, está menos para o sucesso da banda e mais para as postagens de paródias, feitas por “mentes criativas”. A matéria considera o vídeo da banda “fofo”, a letra como um “mantra de amor” e a cena que termina “Oração”, uma “festa florida na sala de estar”. Está claro que a matéria ganhou ares de brincadeira, como se a notoriedade da banda já estivesse com seu fim decretado.

Pelo título “A Banda Mais Bonita da Cidade já é sondada por gravadoras”, a segunda matéria parecia dar mais credibilidade à banda. No entanto, percebe-se que não diante das primeiras linhas. Diferente da primeira, a matéria ouviu os músicos e contou com detalhes como o vídeo foi feito: seis minutos de plano-sequência. Considerou que as imagens do vídeo “Oração” são de “paz e amor” e que elas seriam as responsáveis pelos “amores imediatos” e “ódios instantâneos”.

O suposto interesse da indústria fonográfica é referido em apenas uma frase: “A Banda já foi procurada por algumas gravadoras”. A matéria também cita um show já marcado no Studio SP e considera que os músicos devem se dedicar à agenda de shows para que se tornem “algo além de um vídeo na internet. Têm muito trabalho pela frente”. Mais uma vez, o grupo é visto com descrédito; muito ainda precisaria ser feito para que ele se tornasse algo além do mundo virtual.

A terceira matéria enfoca uma paródia polêmica do clipe, com o título “Paródia de A Banda Mais Bonita da Cidade vira hit na internet ao dar bronca em reitor da UFPB”. No vídeo, alunos de Mídias Digitais reclamam do atraso de mais de um ano na construção do prédio do curso, o que estaria comprometendo seu ensino. Na quarta matéria, “Vídeo da Banda Mais Bonita da Cidade ganha versão ‘nerd’”, é citada outra paródia feita pela equipe do site Nerdice.com.

A quinta matéria ainda aposta na mesma estrutura: explica como o vídeo de “Oração” foi feito, em um casarão na cidade de Rio Negro, divisa entre Paraná e Santa Catarina, e menciona os “fãs e detratores” que a Banda conquistou. A crítica vem na seguinte frase: “Por ora, o reconhecimento no mundo off-line ainda é tímido”. No entanto, as paródias desta vez ganham uma classificação acadêmica: a cultura do remix, em que as pessoas têm possibilidade de dialogar com aquilo que encontram na rede e ferramentas para criar suas próprias versões.

A sexta matéria, “Disco da Banda Mais Bonita da Cidade será financiado pela web”, traz, ainda que de forma sucinta, a novidade: no site Catarse.me, os internautas poderiam pagar pelas faixas que gostariam de ouvir no primeiro CD. A música que não atingisse um valor mínimo não seria gravada, e o internauta receberia seu dinheiro de volta. “Oração” já teria arrecadado o valor mínimo, segundo a matéria, que não apresenta mais informações a respeito das outras canções.

Duas semanas depois, a última matéria traz a surpresa já no título: “Banda Mais Bonita da Cidade arrecada quase R$ 50 mil na internet”. “Amada e odiada”, a banda teria seu álbum de estréia assim pago. O hit “Oração”, que fez com que o grupo estourasse no mundo virtual, teria arrecadado mais de R$ 5 mil, ultrapassando o limite necessário para que seja gravado.

 

Críticas e ironias

 

Percebe-se que as matérias analisadas da Folha de São Paulo, sem exceção, ainda são muito críticas à banda. Os elogios são poucos e, quando ocorrem, é mais no sentido de brincadeira, com palavras como “mantra”, “fofinho” e “festa florida”. Pareciam estar diante de mais um fenômeno da rede que teria seu fim tão rápido quanto seu começo.

Esse enquadramento negativo fica mais claro ao se comparar uma matéria do mesmo período do jornal “O Estado de S. Paulo”. Com o título “A Banda Mais Bonita da Cidade aposta na fofura e nos descolados da rede”, a matéria sustenta que a qualidade do vídeo de “Oração” teria causado “espanto” e poderia ter inaugurado o movimento musical dos “Novos Curitibanos”. Essa seria uma referência ao conhecido movimento dos “Novos Paulistas”, composto de Dudu Tsuda, Tulipa, Tié, Thiago Pethit, entre outros. Nesta matéria, o Estado descreve que os comentários negativos na rede social “Facebook” são quase inexistentes e que o hit agradou os ouvidos indies.

Em conclusão, vê-se que as matérias da Folha de SP não apostaram na Banda Mais Bonita da Cidade, ainda que ela tivesse pulado de hit do Youtube.com para a arrecadação de R$ 50 mil reais através da internet, uma proeza de que poucos seriam capazes. Junta-se a isso o curto período: nem dois meses.

Em contrapartida, a matéria do Estado de SP enxerga o sucesso da banda através de um cenário mais amplo e contextualizado. Sua aposta é que o hit “Oração” inaugurou um movimento musical indie proveniente de Curitiba, semelhante ao movimento dos “Novos Paulistas”. E que, agora, a meta deve ser o trabalho. Afinal, segundo o texto, os seis minutos de fama da Banda Mais Bonita da Cidade já teriam sido conquistados.