Direitos de crianças e adolescentes em pauta no jornalismo brasileiro


Aline Camargo

A Convenção Internacional dos Direitos da Criança e a legislação brasileira consideram a criança e o adolescente como prioridades absolutas. No país, a Unesco situa a juventude como alvo estratégico para a ação de políticas públicas, seja pela garantia dada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente ou por sua condição de sujeitos de direitos, atores estratégicos do desenvolvimento e situação de vulnerabilidade. De que maneira o jornalismo realiza a cobertura jornalística deste segmento da sociedade?

Pesquisas sobre a cobertura jornalística de temáticas relacionadas à preservação dos direitos de crianças e adolescentes indicam que o número de matérias sobre o assunto cresceu sistematicamente nos últimos 14 anos. Os textos têm sido investigados em seus aspectos de técnicas investigativas empregadas, pluralidade de fontes, enfoques que representem diversidade de gênero e cor e que contenham informações sobre políticas públicas do setor, provenientes de fontes como o Estatuto da Criança e do Ado­lescente, que em julho de 2010 completou 20 anos de sua promulgação. Ainda que o tema esteja mais presente no cotidiano dos jornalistas e dos leitores, o que se observa nos textos é algo preocupante.

Pesquisa

Em pesquisa de iniciação científica, foram observadas questões como a frequência em que a única ou principal fonte das matérias são boletins de ocorrência, o que resulta em abordagens superficiais e contextualizações insuficientes; a falta de informações sobre causas e soluções para o problema apresentado, que muitas vezes aparece como fato isolado, individualizado; bem como de que maneira conceitos como objetividade e sensacionalismo estão presentes nas reportagens.

A análise foi baseada em autores especializados nos temas que envolvem a pesquisa, como direitos de crianças e adolescentes, ética e jornalismo e políticas públicas. Trabalhou-se em corte comparativo dos enquadramentos da cobertura jornalística sobre temáticas ligadas à preservação dos direitos de crianças e adolescentes e à violência, cometida ou sofrida por crianças e adolescentes, dos jornais Folha de São Paulo, tido como veículo de referência que adota o ideal de objetividade jornalística, e Agora São Paulo, que explora apelos que podem ser considerados sensacionalistas pela literatura especializada, no período de julho de 2010 a dezembro de 2010, a fim de avaliar a potencial contribuição que possam oferecer à formação da cidadania.

Resultados

Nos resultados, observou-se que o caráter difuso da responsabilização política constantemente presente nas matérias, com a ênfase em testemunhos de vítimas e pessoas comuns que sofrem as consequências da política, faz com que desapareça das matérias o nível de responsabilidade da gestão pública.

De 130 matérias analisadas, 74 publicadas no jornal Agora São Paulo e 56 na Folha de São Paulo, 64 (49,23%) tiveram a violência, sofrida ou cometida por crianças e adolescentes, como tema. Outras 66 (50,76%) matérias trataram da temática dos direitos de crianças e adolescentes.

Apenas 30 matérias (23,07%) apresentaram informações amplas e contextualizadas sobre causas e soluções para os problemas apresentados; 26,15% (34 textos) não apresentaram informações e 57,92% (66) apresentaram causas e soluções superficiais.

Informações sobre políticas públicas estiveram presentes em 25 matérias (19,23%), foram apresentadas de maneira superficial em quatro matérias (3,07%), e em 101 matérias (77,69%) não há informações. Dados e discussões específicas sobre o assunto estiveram presentes em 35 matérias (31,53%).

O tema mais presente nas reportagens analisadas foi a educação: 36 matérias (27,69%) trataram do assunto. Os atores sociais mais presentes nas matérias publicadas na Folha de São Paulo foram as prefeituras e secretarias, que estiveram em 25 das 56 matérias (44,64%). Já no Agora São Paulo, a polícia aparece em 29 das 74 reportagens, (39,18%), e as secretarias e prefeituras apareceram com a mesma frequência.

O sensacionalismo esteve presente na Folha de São Paulo em quatro matérias (7,14% do total de 56 matérias) e, no Agora São Paulo, em 16 reportagens (21,62% do total de 74 matérias). O sensacionalismo foi observado pela linguagem das matérias, principalmente a utilização do discurso direto, a proximidade entre narrador e leitor e a linguagem cotidiana.

Outras etapas da pesquisa, como comparações das matérias publicadas pelos dois veículos quanto a datas e temas, e análises de enquadramento mais específicas ainda serão realizadas.


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