Mariane Bovoloni
Matéria publicada na edição 231 da revista Galileu, de outubro de 2010, enfocou a possível legalização da maconha no Brasil. Com o título “Maconha: a ciência da legalização”, o texto insere o que foi considerado como novidade: pela primeira vez, não seriam “políticos ou artistas com ideais liberais” que levantavam a polêmica da legalização da droga, mas sim “quatro dos cientistas mais respeitados do Brasil”.
O que reacendeu a discussão sobre a droga, de acordo com o texto, foi a prisão de Pedro Caetano, guitarrista da banda de reggae carioca Ponto de Equilíbrio. Seguidor rastafári, que usaria maconha em seus rituais, Pedro cultivava em seu quintal dez pés. Acabou sendo preso como traficante.
Ao longo do texto, é esboçado um painel dos principais pontos avaliados pelos pesquisadores a respeito da legalização da maconha, que seria usada como remédio para amenizar dores causadas por diversas doenças e teria malefícios não tão graves quanto se pensava, em especial se comparados aos resultantes do tráfico.
Compõem a matéria duas entrevistas. Uma com o psiquiatra Ronaldo Laranjeiras, contra a Cannabis, e outra com o neurocientista Sidarta Ribeiro, a favor.
Também há três quadros. O primeiro apresenta um resumo sobre a situação de cinco países, indo da despenalização até a legalidade. Outro, um “Glossário da Lei”, explica a diferença entre os termos despenalização, descriminalização e legalização. Por último, um quadro com um gráfico sobre o risco das drogas: a maconha aparece, atrás do álcool e do tabaco, como de pouco risco. Tal afirmação leva em conta o “dano físico ao usuário, potencial de vício e impacto na sociedade”.
Em diferentes trechos da matéria da revista Galileu, podemos notar que é dado um destaque maior aos argumentos a favor da legalização da droga, enquanto são minimizados aqueles contra. Exemplo seria um estudo sueco sobre a relação entre uso de maconha e desenvolvimento da esquizofrenia. Segundo ele, as pessoas que se utilizaram da droga em torno dos 18 anos aumentaram em 2,4 a propensão à doença. No entanto, a matéria cita os argumentos do livro “Maconha, cérebro e saúde”, segundo o qual “não se sabe o que vem antes, o ovo ou a galinha”. Ou seja, o estudo sueco não tem como provar se as pessoas se tornaram esquizofrênicas justamente por terem usado maconha. E conclui: “Afinal, os efeitos calmantes e sedativos são apenas um dos benefícios da erva já comprovados cientificamente”.
A própria posição dos quatro cientistas a favor da legalização ganha maior destaque, uma vez que aparece por duas vezes na matéria. A primeira é durante o texto. A segunda, na página seguinte, logo abaixo de suas fotos. O mesmo não ocorre com os dois cientistas contra.
No texto, todos os argumentos contra a legalização da maconha vão sendo quebrados, um a um, com a citação de estudos publicados em revistas médicas estrangeiras ou pelos argumentos dos quatro cientistas brasileiros. Sobre isso, podemos citar os seguintes trechos: “Afinal, como conseguir recursos para investigar uma substância proibida?”; “Apesar de todo o aparato de repressão, no mundo cerca de 160 milhões de pessoas fumam maconha” e “… um dos capítulos deixa claro que os autores não negam os riscos médicos da substância, mas questionam se isso justifica proibi-la”.
Por fim, o texto conclui que a discussão sobre a Cannabis sativa está longe de ter um fim, mas que os quatro cientistas a favor já se darão por satisfeitos se seus posicionamentos ocasionarem uma mudança de perspectiva.
Assim, com os pontos citados, podemos considerar que o posicionamento da revista Galileu é a favor da legalização da maconha e, ao valorizar tais argumentos, acabou explorando de forma superficial os contrários, prejudicando uma visão ampla e realista do assunto.