As causas da infância roubada segundo o jornalismo


Mariane Bovoloni


Há quase 20 anos, o jornal Folha Universal, da Igreja Universal do Reino de Deus, é fonte de informação geral aos seus leitores. Nele, podemos encontrar matérias de caráter institucional, mas também sobre políticas públicas, saúde, ciência e comportamento. Hoje, suas edições ultrapassam os 2,5 milhões de exemplares.

A reportagem de capa da edição que circulou na semana de 10 a 16 de outubro de 2010 abordou problemas sociais que afetam a infância. “Esquecidas, crianças vivem à mercê das drogas, dos abusos sexuais, da violência, dos trabalhos forçados. Sem futuro, são presas fáceis do crime”, segundo a matéria, que descreve a situação de cinco meninos que dormem sob tiras de papelão em uma calçada a poucos metros do Conselho Tutelar da Sé, em São Paulo.

Compõem a matéria dados divulgados pelo Observatório Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, órgão da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, sobre o número de denúncias de abuso sexual infantil pelo Disque 100 e partos realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em meninas de 10 a 19 anos, e o número de crianças que trabalham no Brasil e não foram matriculadas na escola, segundo a Organização Internacional do Trabalho.

O Estado é visto como despreparado e omisso. “Não dá pra julgar a culpa apenas em cima de famílias quando o Estado se furta na sua parte”, de acordo com o depoimento de uma das fontes da matéria, que possui três quadros complementares. O primeiro critica a ação do Conselho Tutelar, que não adotaria os procedimentos necessários. O segundo aponta como causa do trabalho infantil a existência de “famílias desestruturadas”, nas quais mães que também trabalharam na infância criam, sozinhas, seus filhos. “Para combater trabalho infantil, é preciso diminuir a pobreza, o que envolve toda a família”. O terceiro sustenta que o Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser respeitado. A solução para conter a criminalidade infantil, pobreza e o desemprego viria de medidas sócio-educativas, ainda que “os setores mais conservadores” defendam a prisão de crianças e adolescentes, sem medidas de acompanhamento educacional.

De acordo com a perspectiva central do texto, violência, abuso e trabalho infantil seriam causados pela falta de planejamento familiar. “Tudo por que o Brasil ainda teima, por força dos setores conservadores, em não levar a sério o planejamento familiar”, segundo o texto. “A prevenção da gravidez com pílulas anticoncepcionais e preservativos ainda é vista como um tabu”.

A erotização da infância seria um agravante, segundo a matéria, mas não se avança na explicação de por que isso dificultaria a proteção da infância. Também não há uma investigação sobre quem os meninos da Sé, por que estavam nas ruas e qual o destino que teriam através do Conselho Tutelar.

A matéria utiliza dados concretos para fundamentar suas análises, originados por órgãos públicos, mas conclui de forma abstrata e pontual. Os problemas que envolvem a infância possuem especificidades e estão inseridos em contextos distintos, de forma que não devem ser examinados em recortes desvinculados do quadro mais amplo.


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