Programa da BBC exibe reportagens densas


Francisco Trento


Nos últimos anos, grande parte das matérias do Globo Repórter é restrita a pautas que já se mostraram esgotadas e cansativas, cujas edições parecem infinitas repetições do mesmo. O programa, que já foi palco da formação de talentos do gênero documentário, como Eduardo Coutinho, e tratava com liberdade aspectos da sociedade, hoje mostra pouca contestação. Suas transmissões nas sextas-feiras têm se restringido à abordagem de novos tratamentos estéticos e viagens a paraísos naturais da Terra.

Das edições produzidas no ano de 2010, mais da metade tiveram como eixo narrativo lugares exóticos, natureza ou novas possibilidades em dietas e estética. Apesar de, por muitas vezes os programas terem boa qualidade e serem bem pautados, é comum sentir um enjoo do “Globo Repórter”, pois a falta de variação já criou a expectativa para o público, que todo fim de semana espera mais do mesmo.

Não é possível dizer o mesmo do programa de grandes reportagens Horizon, produzido pela emissora estatal britânica BBC. A série já teve vários formatos, mas atualmente tem um protagonista tecendo a trama narrativa por semana. Um “detetive” escolhido pela BBC pesquisa assuntos, que podem ser complexos, através de histórias humanas, viagens e entrevistas. Sua primeira edição foi transmitida em maio de 1964, e hoje, 1804 episódios depois, ainda pode ser destacada pela abrangência dos temas tratados, que envolvem desde saúde, cultura e política, a reflexões mais complexas, que envolvem questões científicas e filosóficas.

Nesta última temporada, por exemplo, vários capítulos tiveram como mote assuntos que beiram a total abstração. Prova disso é a edição “To Infinity and Beyond”, transmitida em 10 de fevereiro de 2010. O mote desta transmissão foi explicar o conceito de “infinito”, analisando a possibilidade da inexistência da finitude no universo. Para apoio teórico, foram feitas entrevistas com especialistas em filosofia, matemática e física. Ainda nesse último ano, foram discutidos no Horizon a legalização da maconha e a superpopulação do planeta.

Por muitas vezes, entretanto, há uma radicalização e sensacionalismo no tratamento de alguns temas, vistos por ângulos que induzam teorias conspiratórias. É preciso atenção para a confiabilidade de algumas teorias. Mas não se pode negar a qualidade da produção da série, até mesmo no quesito fotografia, que lembra boas películas de cinema.

É interessante rever um de seus primeiros episódios, “The Knowledge Explosion”, um especial com o dramaturgo de ficção científica Arthur C. Clark, cuja principal produção foi a quadrilogia “Odisseia no Espaço”, – o primeiro livro foi feito para o roteiro da obra-prima de Stanley Kubrick. Na época, há 46 anos, ele foi questionado pelo jornalista sobre as perspectivas que tinha sobre o futuro da humanidade. O visionário fala da revolução causada pelos satélites de telecomunicação, e algumas de suas previsões se tornaram assustadoramente reais. “Em qualquer lugar da Terra que estivermos, poderemos contactar nossos amigos, mesmo que desconheçamos a localização física deles. Será possível, nessa era, daqui a cerca de 50 anos, será possível controlar negócios do Tahiti, ou de Bali, assim como de Londres.”, profetiza Clark. O vídeo recentemente foi “redescoberto”, no Youtube, podendo ser visto através aqui.

Vale lembrar que a BBC é mantida pelos impostos pagos pela população britânica. Para cada aparelho de TV nas residências, é cobrada uma taxa de £145,00 (cerca de 500 reais). O enorme montante de dinheiro obtido através do recolhimento das taxas é, juntamente com propostas antigas e bem-sucedidas de produção de programas educativos, um dos motivos que leval a emissora estatal a produzir, na opinião de muitos, a melhor programação televisiva do mundo. Há muito espaço em sua grade para documentários e séries de confecção própria de qualidade incontestável.

No Brasil, não há uma distribuidora que detenha os direitos de transmissão do BBC Horizon. Entretanto, é possível assistir às edições do Horizon através do Youtube, ou baixá-las em sites de compartilhamento de arquivo, legendadas em inglês.


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